Catholica 122. O Grande Cisma do Oriente de 1054: a divisão entre católicos e ortodoxos
Em 1054, o cristianismo vivenciou um evento histórico conhecido como o Grande Cisma, que formalizou a separação entre o Oriente e o Ocidente cristãos. Esse cisma não criou "duas Igrejas", pois, como cremos e professamos, a Igreja é uma, santa, católica e apostólica, como afirmamos no Credo. No entanto, o cisma gerou uma divisão entre a Igreja em comunhão com o Bispo de Roma e as comunidades cristãs do Oriente, conhecidas como Igrejas Ortodoxas, que, embora tenham mantido a sucessão apostólica e sacramentos válidos, não estão em plena comunhão com a Sé de Pedro.
As Igrejas Ortodoxas e a Sucessão Apostólica
As Igrejas Ortodoxas, que incluem as tradições grega, russa, sérvia, entre outras, são consideradas verdadeiras Igrejas no sentido pleno. Isso porque mantêm a sucessão apostólica, uma tradição ininterrupta de bispos desde os Apóstolos, e possuem sacramentos válidos, incluindo a Eucaristia. Essa sucessão é um dos fundamentos que as legitima como autênticas comunidades cristãs.
No entanto, a principal diferença entre essas Igrejas e a Igreja Católica é a ausência de comunhão plena com o Papa, o Bispo de Roma, que é visto pelos católicos como o sucessor de São Pedro e o símbolo visível da unidade da Igreja. Para os católicos, o papel do Papa é essencial para manter a unidade da Igreja em todo o mundo.
Principais Diferenças Históricas e Teológicas
A separação entre as Igrejas em 1054 foi o resultado de um longo processo de divergências culturais, políticas e teológicas. Algumas das diferenças que surgiram ao longo dos séculos incluem:
Primado do Papa: As Igrejas Ortodoxas reconhecem o Papa como "primeiro entre iguais", um título de honra, mas não aceitam sua autoridade universal sobre toda a Igreja. Por outro lado, os católicos veem o Papa como o pastor supremo, com jurisdição sobre toda a Igreja.
O Filioque: A adição da frase "e do Filho" ("Filioque") ao Credo Niceno-Constantinopolitano pelo Ocidente foi uma das questões teológicas que agravaram a separação. As Igrejas Ortodoxas mantêm a fórmula original, defendendo que o Espírito Santo procede apenas do Pai, enquanto os católicos afirmam que o Espírito Santo procede do Pai "e do Filho".
Uso do Pão Ázimo na Eucaristia
Uma das controvérsias que surgiu entre Oriente e Ocidente foi a questão do tipo de pão utilizado na celebração eucarística. Na tradição católica ocidental, o pão ázimo (sem fermento) é utilizado, baseado na prática judaica da Páscoa e nas passagens evangélicas que sugerem que Jesus utilizou pão sem fermento na Última Ceia. Por outro lado, as Igrejas Ortodoxas usam pão fermentado, simbolizando a nova vida em Cristo e a Ressurreição. Embora essa diferença litúrgica possa parecer pequena, ela ganhou uma dimensão simbólica no contexto das divergências mais amplas entre as Igrejas. Atualmente, o uso de diferentes tipos de pão não é visto como um obstáculo intransponível para a unidade, mas ainda representa um ponto de distinção nas práticas litúrgicas.
A Consagração e a Epiclese
Outra diferença litúrgica importante está na forma como a consagração do pão e do vinho é compreendida. Na Igreja Católica, a consagração ocorre com as palavras da instituição ditas pelo sacerdote: "Isto é o meu Corpo" e "Este é o cálice do meu Sangue". Já nas Igrejas Ortodoxas, além das palavras da instituição, dá-se uma ênfase especial à epiclese, a invocação do Espírito Santo para transformar os dons eucarísticos no Corpo e Sangue de Cristo. Embora ambas as tradições acreditem que o pão e o vinho se tornam verdadeiramente o Corpo e o Sangue de Cristo, a diferença está no modo de enfatizar os momentos da consagração. As Igrejas Ortodoxas consideram a epiclese um momento essencial, enquanto a Igreja Católica tradicionalmente não lhe confere a mesma centralidade, embora a reconheça como parte da oração eucarística.
Infalibilidade Papal: Enquanto a Igreja Católica, desde o Concílio Vaticano I (1870), afirma a infalibilidade do Papa em questões de fé e moral quando fala "ex cathedra", as Igrejas Ortodoxas não aceitam essa doutrina, defendendo que a verdade da fé é garantida pela Igreja em sua totalidade, especialmente através dos concílios ecumênicos.
O Caminho do Diálogo Ecumênico
Nos últimos séculos, o diálogo entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas tem se intensificado. O Concílio Vaticano II (1962-1965) deu um grande impulso ao diálogo ecumênico, reconhecendo as riquezas espirituais e teológicas presentes nas Igrejas Ortodoxas. Um dos maiores frutos desse diálogo foi a retirada das excomunhões mútuas de 1054, em um gesto histórico de reconciliação entre o Papa Paulo VI e o Patriarca Atenágoras I, em 1965.