Catholica 121: O Grande Cisma do Oriente de 1054

28/09/2024

O Cisma do Oriente, que culminou na separação entre a Igreja Católica e a Igreja Ortodoxa no ano de 1054, foi um processo complexo, marcado por um longo histórico de incompreensões mútuas, divergências políticas e disputas doutrinais. Embora o evento simbólico do cisma tenha ocorrido com a troca de excomunhões entre o patriarca Miguel Cerulário de Constantinopla e o legado papal Humberto de Silva Candida, ele foi o ponto culminante de séculos de tensões crescentes entre o Ocidente latino e o Oriente grego.

Diferenças Culturais e Linguísticas

A mútua incompreensão entre Oriente e Ocidente se enraizou, em grande parte, nas diferenças culturais, linguísticas e geográficas. O uso do latim na Igreja Ocidental e do grego na Igreja Oriental não era apenas uma questão de língua, mas também de mentalidade. As duas regiões desenvolveram tradições teológicas e litúrgicas diferentes, o que levou a uma gradual alienação.

No Ocidente, a influência do Direito Romano contribuiu para uma visão mais centralizada da autoridade eclesiástica, onde o papa, bispo de Roma, era visto como a figura de maior preeminência. Já no Oriente, uma perspectiva mais colegial de governo eclesiástico prevaleceu, com os patriarcas de várias sedes (Constantinopla, Alexandria, Antioquia, e Jerusalém) assumindo papeis importantes.

Divergências Doutrinais

Embora a questão da autoridade papal tenha sido central para o cisma, outras divergências doutrinais contribuíram para o agravamento das tensões. A questão do Filioque, uma adição feita ao Credo Niceno pelos cristãos do Ocidente, que afirmava que o Espírito Santo procede "do Pai e do Filho", foi particularmente controversa. Para a Igreja do Oriente, esta alteração, feita sem a consulta de um Concílio Ecumênico, foi vista como um abuso de poder e uma corrupção da fé original.

Outra questão significativa foi a disputa sobre a natureza da Eucaristia. Enquanto o Ocidente usava pão ázimo (sem fermento) para a celebração da missa, o Oriente mantinha a prática de usar pão fermentado. Embora pareça uma diferença litúrgica menor, essa discordância refletia uma incompreensão mais profunda entre as tradições.

Fatores Políticos

Os fatores políticos também desempenharam um papel crucial no Cisma do Oriente. Desde a fundação de Constantinopla como a "Nova Roma" pelo imperador Constantino, houve uma tensão sobre qual cidade, Roma ou Constantinopla, detinha maior autoridade no cristianismo. A ascensão de Constantinopla como capital do Império Bizantino deu ao patriarca da cidade uma importância crescente, o que foi visto com suspeita por Roma.

Além disso, a queda do Império Romano no Ocidente no século V e a subsequente ascensão do Sacro Império Romano-Germânico levaram a uma reconfiguração do poder político e eclesiástico. A relação entre o papa e o imperador bizantino tornou-se cada vez mais distante, enquanto o papa se aproximava dos reis e príncipes do Ocidente, particularmente do imperador germânico.

Consolidando a Separação

A excomunhão mútua de 1054 foi o ponto de ruptura mais visível, mas o cisma foi consolidado ao longo dos séculos seguintes por diversos fatores. As Cruzadas, em especial a Quarta Cruzada, que resultou no saque de Constantinopla em 1204, exacerbaram o ressentimento entre as duas Igrejas. O papado no Ocidente foi incapaz de conter as ações dos cruzados, o que foi visto como um ataque direto ao coração do cristianismo oriental.

Apesar de várias tentativas de reconciliação, como o Concílio de Lyon (1274) e o Concílio de Florença (1439), a separação já estava profundamente enraizada. As diferenças teológicas, litúrgicas e de autoridade tornaram-se difíceis de superar, e o cisma entre Roma e Constantinopla se manteve.

Considerações Finais

Do ponto de vista católico, o Cisma do Oriente representa uma dolorosa ruptura na unidade da Igreja, que é chamada a ser "uma só" em Cristo. No entanto, é também um lembrete das complexidades históricas que envolveram o processo. A separação entre as Igrejas não foi causada por um único ato, mas por um longo acúmulo de incompreensões, rivalidades e conflitos. Embora a Igreja Católica mantenha a posição de que a plena comunhão só pode ser alcançada com o reconhecimento do primado do papa, é essencial reconhecer que o diálogo ecumênico iniciado no século XX tem promovido uma maior compreensão e respeito mútuo entre católicos e ortodoxos, oferecendo esperança de que um dia essa unidade possa ser restaurada.